Sustentável leveza do ser

Política e Ambiente

Algumas leis ‘pegam’; outras são ‘para inglês ver’

A Câmara de Mairiporã aprovou na sessão de 22 de março o Projeto de Lei nº 13, de autoria do Poder Executivo Municipal. O Projeto modifica a Lei nº 4.083, de 20 de dezembro de 2021.  A primeira observação: qual o motivo de revisar uma lei menos de dois meses após sua aprovação?

Vejamos. Do que trata a lei modificada? Por meio dela, foi instituído o “Programa Municipal de Implementação da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável da Organização das Nações Unidas”.

Não entrarei em detalhes sobre o Programa em nossa cidade. A Agenda 2030 é definida pela Ecam (Equipe de Conservação da Amazônia) como “um plano de ação global que reúne 17 objetivos de desenvolvimento sustentável e 169 metas, criados para erradicar a pobreza e promover vida digna a todos, dentro das condições que o nosso planeta oferece e sem comprometer a qualidade de vida das próximas gerações”.

Sustentabilidade e ESG* são temas ‘da moda’

Curiosamente, várias iniciativas, desde o acordo firmado em 2015 pelos 193 Estado-membros da  Organização Das Nações Unidas (ONU), sugeriram à Prefeitura a inclusão dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável como base  para a elaboração e avaliação de políticas públicas setoriais.

Destaco o esforço de Bianca Forti, ex-presidente do Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente (Comdema), e do arquiteto e ativista Mário Nascimento nesse sentido. Durante o processo de revisão do Plano Diretor, ainda em 2019, o Movimento Viva Cantareira também sugeriu a inclusão dos ODS (Objetivos do Desenvolvimento Sustentável). Não houve, no entanto, nenhum avanço nesse sentido.

Tudo isso aconteceu antes de sustentabilidade, ESG e emergência climática terem se tornado temas da ‘alta costura’ política: muito falados e pouco entendidos.

Sustentabilidade é transversal e participativa

Retomando a questão da lei, é interessante notar que o projeto aprovado excluiu a participação popular do processo de implementação dos ODS, que deixou de ser coordenado por um conselho participativo, o Conselho de Desenvolvimento Sustentável  – Condesu (Lei nº 1.921, de 11/12/1998), e passa a ser coordenado pela Secretaria de Meio Ambiente.

Esse Conselho, que seria subordinado a uma utópica “Secretaria do Desenvolvimento Sustentável”, teria função consultiva e de assessoramento da Prefeitura, que seria, pela abrangência, o mesmo Conselho Municipal da Cidade (Comcidade), previsto no Plano Diretor aprovado recentemente, mas com um enfoque na sustentabilidade. Lembrando, ainda, que nenhum dos dois Conselhos foi efetivamente implementado.

Por uma nova política

Perdemos, portanto, 24 anos de busca pela busca sustentabilidade, já que a previsão legal do Condesu e da Secretaria do Desenvolvimento Sustentável é de 1998. Além disso, subordinar a questão da sustentabilidade à Secretaria do Meio Ambiente enfraquece seu caráter intersetorial. A questão deve ser vista como estratégica e central em todas as áreas de atuação do Poder Público, contando, além disso, com a participação popular efetiva.

Não se trata aqui de criticar a pessoa de gestores e funcionários, muito qualificados e empenhados. Mas já é tempo de ultrapassar a visão tecnocrática, que teve seu lugar nos anos 1970, e adotar o modelo participativo e integrativo, garantindo que a população, por meio dos conselhos participativos, possa auxiliar nessa evolução na gestão pública, assim como a sinergia entre políticas.

Não se trata de interferir na gestão municipal: ela ganha com a participação popular, na variedade e qualidade de propostas, que poderão ser adotadas ou descartadas pela Prefeitura, em função de plano de governo e de conveniência política.

De todo modo, é louvável a iniciativa, embora, mais uma vez, a participação popular tenha ido para escanteio. Espero que essa lei ‘pegue’ e não seja apenas uma lei ‘para inglês ver’. A propósito, você conhece a origem dessa expressão?

Flavio Soares de Barros

*Governança ambiental, social e corporativa – do inglês Environmental, social and corporate governance. (ESG), ou ASG em português, é a sigla que representa os termos environmental  (ambiental), social  (social) e governance  (governança). Sua função é medir o impacto social e sustentável de um investimento em determinado negócio.

Ilustração
Criador:  https://www.facebook.com/PlargueDoctor/ Crédito: Getty Images/iStockphoto

 

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